segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

"The mothman prophecies" (2002)


Desde o final da década de 60 que estava deitadinha, à espera que alguma luminária do cinema lhe pegasse, uma história real onde a linha da própria realidade e da ficção é um pormenor da maior importância: o conjunto de fenómenos que se sucederam entre 1966 e 1967, em Point Pleasant, na Virgínia Ocidental. A responsabilidade foi atribuída a uma entidade vaga, com forma definida, mas intenções e ligações a tudo estranhas, chamada Mothman, pegando numa personagem da série televisiva "Batman", que passava na altura na televisão. O caso foi descrito pelo jornalista John Keel, na excelente e bizarra obra "The mothman prophecies". Envolve a criatura Mothman, OVNI, homens de negro, poltergeist, fenómenos psíquicos e profecias; e é tudo de uma lógica que não parece fácil de rebater.
Quase 40 anos depois, alguém se lembrou da história e surgiu o filme. Um aviso: a fita, em termos de conteúdo, não faz justiça ao imenso planalto de biasma que é o livro. Mas isso seria impossível de conseguir numa longa-metragem. Uma série de televisão era o mais adequado. No entanto, um produtor menos temerário lançou-se a uma empreitada quase impossível e o resultado é uma experiência estranha, um filme daqueles em que a imagem é como fumo que se entranha. Foi necessário, claro, atalhar pela história do livro e no filme, o enquadramento é diferente: John Klein (Richard Gere) é um respeitado comentador político do Washington Post, que no auge da sua felicidade com a mulher, a vê morrer, não sem antes esta desenhar interminavelmente em folhas a mesma sombria criatura. Desolado pelo acontecimento, Klein é um homem à deriva e numa noite em que viaja de carro, dá por si a fazer 1600 quilómetros em três horas, parando em Point Pleasant, Virginia, onde vai bater à porta de um homem que lhe diz que ele esteve ali nas duas noites anteriores, à mesma hora. Isto é apenas o princípio de uma história que o junta a Connie Mills (Laura Linney), a xerife local.
Menos um filme de terror do que um exercício de como entrar na nossa mente e remexê-la um pouco retorcidamente, "The mothman prophecies" tem o visual de um filme experimental, com alguns efeitos de baixo orçamento e aquela noção de que uma banda sonora penetrante e saber jogar com a luz e a sombra são truques básicos para nos convencer de que estamos a ver mais do que realmente vemos. Mark Pellington realizara já videoclips e é o autor do estilizado genérico de "Homicide: Life on the street". Para além disso, com o seu "Arlington road", obra inicial da sua carreira, soubera que a paranóia é uma excelente matéria cinematográfica. Com este filme, Pellington não cai na tentação de faezr uma adaptação literal, mas sim de nos provocar os mesmmos arrepios, sentimentos e desconfianças que Keel descreve no livro; e consegue-o. Uma sequência em particular, em que Klein fala ao telefone com uma omnisciente entidade que dá pelo nome de Indrid Cold é particularmente enervante e assustadora. Destaque para a dupla de actores, a banda sonora de Tomandandy (muito boa mesmo) e fica o repto para que leiam mais sobre este estranho caso.
Não é um remake do livro e dificilmente dará uma sequela.

Um comentário:

Dieubussy disse...

"Based on true events".

Bastaram essas 4 palavras para tornar uma trailer que achei normalíssima em algo de extraordinário e que iria mudar a minha vida para sempre. Depois do filme seguiu-se o livro e depois do livro uma vida de incertezas. Mothman, muitas vezes relegado para o estatuto de mito moderno, é uma criatura que prenuncia a tragédia, aspecto no qual Pellington baseou o seu projecto.

Estou perfeitamente de acordo com os elogios que teces relativamente ao filme e à forma destemida como o realizador conseguiu encarar uma obra tão extensa e complexa num filme que, a par de ser um exemplo de como realizar um thriller nos dias de hoje, consegue aludir às poderosas imagens e sentimentos do texto de Keel. Para tornar o feito ainda mais grandioso, conseguiu reunir uma equipa de profissionais respeitados e tornar um projecto desta natureza numa produção de qualidade. O período entre o lançamento do livro e a produção do filme diz, precisamente, que poucos ou nenhuns realizadores tiveram a coragem de pegar neste assunto e esculpir um filme a partir dele.

Agora que mencionas isso, existia uma série televisiva chamada Point Pleasant que, apesar da temática religiosa inicial se poderia muito bem ter focado, em jeito de reviravolta, a criatura Mothman e a pluralidade de objectos estranhos que circulam em seu redor. Isto se não tivesse sido cancelada tão inicialmente...